A dispensa de licitação é um processo mais simplificado se comparado aos processos licitatórios, não obstante, garantir a qualidade dos serviços contratados é essencial.
Para isso, é importante seguir algumas etapas básicas, como realizar um estudo aprofundado das necessidades do órgão público, elaborar um Estudo Técnico Preliminar (ETP) que detalhe os problemas encontrados e proponha a solução mais adequada, desenvolvimento de uma minuta de instrumento contratual (se for o caso) e, por fim, desenvolver um Termo de Referência (TR) que especifique claramente o objeto, bem como os requisitos técnicos, critérios de avaliação, prazos e demais condições de execução desse objeto.
No entanto, mesmo cumprindo rigorosamente essas etapas, ainda podem surgir fornecedores "aventureiros" e não comprometidos com a adequada entrega do objeto. Neste artigo, exploraremos duas ferramentas jurídicas que podem ser utilizadas, a depender do contexto, para para mitigar os riscos de se contratar com esse tipo de fornecedor: o atestado de capacidade técnica e a demonstração técnica.
Embasamento Jurídico: A possibilidade de se exigir a comprovação de habilitação técnica (qualificação técnico-profissional e técnico-operacional) está prevista no artigo 67 da Lei Federal nº 14.133/2021, sendo possível a exigência de atestado de capacidade técnica com fundamento em seu inciso II. A depender do objeto, essa comprovação pode ser importante para verificar se a empresa contratada tem experiência anterior e capacidade para executar o objeto contratual com qualidade.
1. Definição dos Requisitos no Edital/Aviso de Dispensa de Licitação:
- Inclua a necessidade de apresentação de atestados de capacidade técnica no Edital, no Aviso de Dispensa de Licitação ou, se não houver, no próprio Termo de Referência, especificando os tipos de projetos relevantes e a dimensão dos contratos anteriores. Fundamente nos Estudos Técnicos Preliminares a importância, para a contratação específica, de se ter a comprovação da experiência prévia para a maior probabilidade de êxito da boa execução do objeto.
- Critérios de Avaliação: Detalhe os critérios de avaliação dos atestados, como a complexidade dos projetos e a tecnologia utilizada.
2. Solicitação de Atestados:
- Documentação Requerida: Solicite que os licitantes apresentem atestados emitidos por clientes anteriores, comprovando a experiência em projetos similares.
- Detalhes dos Atestados: Os atestados devem incluir informações detalhadas sobre os projetos realizados, como escopo, datas, descrição dos serviços e resultados alcançados.
3. Avaliação dos Atestados:
- Critérios Objetivos: Utilize critérios objetivos para a avaliação, deixando claras as regras exigidas nos documentos mencionados no item 1 acima..
- Importante: A exigência de atestados deverá respeitar as regras impostas pela Lei Federal n. 14.133/2021, em especial as contidas nos § 1º e § 2º do artigo 67. Assim, a exigência de atestados, por exemplo, será restrita às parcelas de maior relevância ou valor significativo do objeto, bem como os quantitativos exigidos não poderão ultrapassar o limite de 50% de tais parcelas. Conforme a jurisprudência dos Tribunais de Contas da União (bem como de outros tribunais estaduais), deve ser admitida a somatória de atestados, salvo se houver justificativa excepcional de que a exigência de atestado único seja imprescindível para a verificação da aptidão técnica para a adequada execução do objeto. Caso os serviços contratados sejam considerados contínuos, poderá ser exigida comprovação de experiência de até três anos na execução de serviços similares aos do objeto (por períodos sucessivos ou não).
4. Inclusão no Processo de Contratação:
- Habilitação Técnica: Considere a apresentação de atestados como um critério de habilitação técnica. Apenas empresas que comprovem experiência adequada devem ser habilitadas.
- Contratação: Se o critério de julgamento da licitação for o “menor preço”, ou nas contratação direta com fundamento no valor da contratação, selecione a proposta vencedora com base no melhor preço, porém apenas admita a habilitação daquelas empresas que comprovarem o atendimento dos requisitos de habilitação técnicas exigidos na contratação.
Embasamento jurídico: Prova de conceito tem previsão no artigo 17, § 3º e artigo 41, inciso II, ambos da Lei Federal n. 14.133/2021. Ela ocorre, em regra, na fase de julgamento das propostas ou lances (na contratação direta, após ranquear as propostas mais vantajosas, a Administração chama a empresa provisoriamente classificada em primeiro lugar para analisar a proposta, verificando se ela atende aos requisitos técnicos mínimos exigidos). Se não atender, a proposta será desclassificada (artigo 59, inciso II e § 1º). A classificação das propostas antecede ao exame dos documentos de habilitação, pois está inserida na fase de julgamento (a sequência procedimental do artigo 17 da Lei Federal n. 14.133/2021, naquilo que couber, pode ser aplicado às contratações diretas).
1. Inclusão no Edital/Aviso de Dispensa de Licitação:
- Inclua a prova de conceito, especificando claramente os critérios técnicos que serão avaliados durante a demonstração, no Edital, no Aviso de Dispensa de Licitação ou, se não houver, no próprio Termo de Referência. Fundamente nos Estudos Técnicos Preliminares a importância, para a contratação específica, da previsão da prova de conceito como ferramenta necessária para assegurar que a empresa proponente possa, por meio desta, atender às exigências técnicas contidas no Termo de Referência.
- Critérios de Avaliação: Defina no edital os critérios específicos para avaliar a demonstração, indicando quais os aspectos técnicas do objeto deverão ser demonstrados nesta etapa.
2. Etapa de Avaliação:
- Publicação do Edital ou do Aviso de Dispensa de Licitação: Após a publicação do edital, as empresas interessadas devem submeter suas propostas. O edital deve informar que a prova de conceito é uma condição para classificação da proposta.
- Seleção Preliminar: Selecione a empresa vencedora com base nas propostas apresentadas, considerando preço e outros critérios definidos no edital.
- Convocação para prova de conceito: Na fase de julgamento das propostas, a empresa vencedora é então convocada para realizar a prova de conceito, verificando se o software ou serviço proposto atende aos requisitos especificados.
- Execução da Demonstração: Durante a demonstração, uma comissão técnica avalia a solução apresentada, utilizando os critérios definidos previamente. A empresa deve demonstrar um percentual mínimo definido no edital das funcionalidades exigidas.
- Cuidado: conforme a jurisprudência de algum dos Tribunais de Contas (como é o caso de São Paulo), os aspectos técnicos indicados para a demonstração, bem como o percentual de êxito mínimo em relação aos itens que deverão ser demonstrados (o qual não poderá ser de 100%), deverão ser estabelecidos de maneira motivada e limitado ao que seja necessário a assegurar que a proposta vencedora tenha aptidão para atender adequadamente ao Termo de Referência.
3. Classificação ou desclassificação das propostas:
- Avaliação dos Resultados: Com base nos resultados da demonstração, a comissão técnica decide se a empresa cumpre os requisitos técnicos. Se o software não atender ao percentual mínimo dos requisitos indicados no edital, conforme as regras objetivamente definidas, a administração deverá desclassificar a proposta, sem prejuízo da possibilidade de recursos administrativos, conforme a disciplina geral da Lei Federal n. 14.133/2021.
- Convocação da Segunda Colocada: Se a proposta provisoriamente classificada em primeiro lugar for desclassificada, a Administração pode convocar a segunda colocada, que também deve passar pelo mesmo processo de demonstração técnica.
A implementação de atestados de capacidade técnica e provas de conceito são ferramentas jurídicas eficazes para melhorar a qualidade dos fornecedores nas contratações públicas (podendo ser utilizado, inclusive, quando operacionalizadas por meio de dispensa de licitação em razão de valor), quando o objeto assim recomendar. Além disso, é crucial monitorar a execução do contrato, estabelecendo mecanismos de fiscalização contínuos para garantir que os serviços estão sendo prestados conforme o acordado. Por fim, os documentos contratuais devem incluir critérios claros para rescisão em caso de inadimplemento, garantindo a continuidade do serviço público com qualidade.
Essas práticas, alinhadas com as disposições da Lei Federal nº 14.133/2021 e as recomendações dos Tribunais de Contas, não apenas asseguram a conformidade legal, mas também promovem a eficiência, transparência e eficácia nas contratações públicas.
Para uma visão mais ampla do processo, você pode ler nosso artigo “Como Contratar um Software de Gestão Educacional via Dispensa de Licitação: Um Guia Prático para Secretários de Educação”